Como liderar
pessoas difíceis
A arte de administrar conflitos
João Carlos Almeida
Como liderar
pessoas difíceis
A arte de administrar conflitos
Simão Zelote: Sei lá...
Judas Tadeu: Você entendeu o
que ele disse?
Mateus: Vocês aí querem parar
a conversa e prestar atenção?
Felipe: Tem certeza disso?
Tiago Maior: Eu não sou!
Tomé: Acaba com esse
mistério e diz logo quem é.
João: Senhor, pode dizer
quem é?
Pedro: Pergunta quem é
que eu mato.
Judas Iscariotes: Acaso serei eu?
André: Não sou eu... mas
posso descobrir quem é.
Tiago Menor: Pergunta logo, Pedro!
Bartolomeu: Sinceramente,
por essa eu não esperava.
Um de vós me trairá!
Editora: Cristiana Negrão
Assistente editorial: Jocelma Cruz
Capa e diagramação: Tiago Muelas Filú
Preparação: Maurício Leal
Revisão: Patricia Bernardo de Almeida
Dedico estas páginas a todos aqueles
que criaram algum tipo de dificuldade em minha vida.
Obrigado por me ajudarem a escrever este livro!
Capa: Ultima Cena - Leonardo da Vinci, 1494-1498 – Técnica mista com predominância
da têmpera e óleo sobre duas camadas de preparação de gesso aplicadas sobre reboco
(estuque). 460 × 880 cm. Refeitório de Santa Maria delle Grazie (Milão-Itália).
Editora Canção Nova
Rua São Bento, 43 - Centro
01011-000 São Paulo SP
Telefax [55] (11) 3106-9080
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ISBN: 978-85-7677-212-5
© EDITORA CANÇÃO NOVA, São Paulo, SP, Brasil, 2010
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
10-07671 CDD-158.2
Índices para catálogo sistemático:
1. Pessoas difíceis : Relações interpessoais :
Psicologia aplicada 158.2
Almeida, João Carlos
Como liderar pessoas difíceis : a arte de
administrar conflitos / João Carlos Almeida. --
São Paulo, SP : Editora Canção Nova,
2010.
ISBN 978-85-7677-212-5
1. Conflito interpessoal 2. Psicologia aplicada
3. Relações interpessoais I. Título.
Aviso aos navegantes
Não escrevi estas páginas porque seja especialista
na arte de liderar pessoas difíceis.
Pelo contrário. Escrevo falando para mim mesmo, pois a
cada dia tenho percebido
o quanto é difícil colocar estas teorias em prática.
Percebi também que tenho sido difícil
para algumas pessoas. Ao ler este livro imagino que elas
saberão melhor como me ajudar a superar estas dificuldades.
Aviso aos navegantes: navegar é preciso!
Palco da vida1
Você pode ter defeitos, viver ansioso
e ficar irritado algumas vezes,
mas não se esqueça de que sua vida
é a maior empresa do mundo.
E você pode evitar que ela vá à falência.
Há muitas pessoas que precisam de você,
que o admiram e torcem por você.
Gostaria que você sempre se lembrasse de que ser feliz
não é ter um céu sem tempestade, caminhos sem acidentes,
trabalhos sem fadigas, relacionamentos sem desilusões.
Ser feliz é encontrar força no perdão, esperança nas batalhas,
segurança no palco do medo, amor nos desencontros.
Ser feliz não é apenas valorizar o sorriso,
mas refletir sobre a tristeza.
Não é apenas comemorar o sucesso,
mas aprender lições nos fracassos.
Não é apenas ter júbilo nos aplausos,
mas encontrar alegria no anonimato.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver,
apesar de todos os desafios,
incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas
e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si,
mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um “não”.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Ser feliz é deixar viver a criança livre, alegre e simples
que mora dentro de cada um de nós.
É ter maturidade para falar “eu errei”.
É ter ousadia para dizer “me perdoe”.
É ter sensibilidade para expressar “eu preciso de você”.
É ter capacidade de dizer “eu te amo”.
É ter a humildade da receptividade.
Desejo que a vida se torne um canteiro de oportunidades
para você ser feliz...
E quando você errar o caminho, recomece,
pois assim você descobrirá que ser feliz
não é ter uma vida perfeita,
mas usar as lágrimas para irrigar a tolerância.
Usar as perdas para refinar a paciência.
Usar as falhas para lapidar o prazer.
Usar os obstáculos para abrir as janelas da inteligência.
Jamais desista de si mesmo.
Jamais desista das pessoas que você ama.
Jamais desista de ser feliz, pois a vida é um espetáculo
imperdível, ainda que se apresentem
dezenas de fatores a demonstrar o contrário.
Pedras no caminho? Guardo todas...
Um dia vou construir um castelo!
Prece da serenidade
Concedei-me, Senhor,
a serenidade necessária
para aceitar as coisas que não posso modificar,
coragem para modificar aquelas que posso
e sabedoria para distinguir umas das outras,
vivendo um dia de cada vez,
desfrutando um momento de cada vez,
aceitando as dificuldades
como um caminho para alcançar a paz,
considerando o mundo como ele é
e não como eu gostaria que ele fosse,
confiando em ti, meu Deus, para endireitar todas as coisas
para que eu possa ser moderadamente feliz nesta vida
e sumamente feliz contigo na eternidade.
Reinhold Niebuhr
Teólogo americano, 1892-1971
Sumário
Apresentação 19
Saberes fundamentais 25
A última ceia
Uma leitura de Leonardo da Vinci 51
Capítulo um
Pedro, o impulsivo 61
Capítulo dois
André, o irmão do gerente 71
Capítulo três
Tiago Maior, o ambicioso 77
Capítulo quatro
Tiago Menor, o parente do “chefe” 83
Capítulo cinco
João, o amigo do “chefe” 87
19
Apresentação
Quando escrevi o livro As Sete Virtudes do Líder Amoroso,
havia uma seção com o título “Como lidar com pessoas
difíceis”. Confesso que não sabia bem o que dizer sobre o
tema. Em minhas palestras normalmente evitava o assunto.
Ser amoroso não significa que você será necessariamente
amado. O que fazer, então, com aqueles que não amam
seus líderes amorosos? Como reagir diante dos invejosos,
rancorosos ou orgulhosos? O que fazer com o pessimista,
o intimidador, o desagradável, o insistente, o sabe-tudo?
Que atitudes o “amoroso” precisa cultivar para se tornar
“amável”? Como diz o antigo ditado italiano:
“Quem quer fazer-se amar, amável deve se tornar”.
Capítulo seis
Mateus, o diferente 95
Capítulo sete
Felipe, o desligado 101
Capítulo oito
Tomé, o descrente 107
Capítulo nove
Bartolomeu, o irônico 113
Capítulo dez
Simão, o “zeloso” 119
Capítulo onze
Judas Tadeu, o contemporizador 123
Capítulo doze
Judas Iscariotes, o traidor 129
A sabedoria dos ditados populares 135
Bibliografia 161
Notas 165
20 21
Diante deste desafio de ser amoroso e amável ao mesmo
tempo, comecei a arriscar falar um pouco sobre o tema.
Vasculhei livrarias e bibliotecas e descobri que mais gente
já havia se debruçado sobre a questão. Incluí alguns destes
livros na bibliografia que você encontra ao final destas
páginas.
Comecei também a conversar com várias pessoas sobre
este tema. Percebi que cada um tem as suas próprias
técnicas para reagir diante das pessoas difíceis. Certa ocasião,
perguntei à plateia, de supetão:
— Como liderar pessoas difíceis?
Um grande líder da região, sentado na primeira fileira,
respondeu impulsivamente, quase sem pensar:
— Não é fácil!!!
De fato, se você quer ser um líder, saiba que terá muitos
amigos, mas prepare-se para ter alguns inimigos. Nem
Jesus escapou desta regra básica da liderança. E não pense
que estou falando de fariseus, doutores da lei, soldados
romanos, Herodes ou Pilatos. O grupo que ele escolheu
como colaboradores mais próximos não era nada fácil.
Sempre existe uma pedra no caminho dos grandes líderes
dentro da própria casa. Grandes e bem-sucedidos empresários
podem enfrentar dificuldades para liderar seus próprios
filhos. Por isso, todos precisam refletir sobre “como
liderar pessoas difíceis”.
Como disse o filósofo Kant, na vida existem pessoas
que nos puxam para cima e outras que nos empurram
para baixo. Poderíamos simplesmente evitar aqueles que
nos criam dificuldades, mas será esta a melhor estratégia?
Pergunto-me se isto é mesmo possível. Existem ocasiões
em que não há como escapar, por exemplo, do irônico.
Como conviver com estas pessoas de modo a que sua ironia
não seja um obstáculo fatal?
Apresentei anteriormente a “Prece da Serenidade”, do
teólogo
americano Reinhold Niebuhr. É a oração preferida
dos grupos de entreajuda para recuperação de pessoas
com todo tipo de vício ou atitude compulsiva. Você já deve
tê-la ouvido e até rezado várias vezes. Encontrei a prece
em sua versão integral. Normalmente conhecemos apenas
a primeira parte. Sugiro que sempre que tomar este
livro nas mãos comece a leitura por esta prece. Rezar diante
das dificuldades ainda é a melhor estratégia para abrir
os caminhos. Moisés que o diga! Foram necessárias muita
fé, muita oração e muita confiança para atravessar o mar
Vermelho a pé enxuto, deixando para trás os perseguidores.
Esta é a questão que o líder precisa se colocar. Vamos
atravessar o mar, custe o que custar. O inimigo ficará para
trás. Mas lembre-se, nem tudo são flores na outra margem.
Sempre haverá um deserto a ser enfrentado. Moisés
levou quarenta anos para fazer daquele grupo de tribos
nômades uma grande nação.
22 23
Inicialmente, vamos conversar sobre alguns saberes
fundamentais para sobreviver nas dificuldades. Recolhi
diversas dicas que podem nos auxiliar na hora em que
nos depararmos com “aquela pessoa”. Uma delas aprendi
com a experiência de diversas pessoas que me disseram:
“Respire fundo”. Dá certo.
Em seguida, vamos conhecer um pouco melhor a famosa
pintura de Leonardo da Vinci que ilustra a capa
deste livro. A Última Ceia, pintada no refeitório da igreja
de Santa Maria delle Grazie (Milão, Itália), está entre as
mais belas e importantes pinturas de que se tem notícia.
Não é apenas mais uma “Santa Ceia”. Esta retrata o momento
de maior “dificuldade” de Jesus no relacionamento
com os apóstolos. No meio da refeição ele revela: “[...]
um de vós me trairá”2. O pintor fez verdadeiros estudos
psicológicos sobre o tipo de cada um dos apóstolos. Levou
cerca de quatro anos para concluir sua obra. Na postura
corporal dos doze é possível identificar vários “tipos”.
Passados quinhentos anos, será que Leonardo ainda teria
algo a nos dizer sobre o modo como Jesus liderou cada
um dos apóstolos?
Para responder a esta pergunta, vamos fazer o contraponto
da pintura com as páginas da Bíblia. Em uma sequência
de doze capítulos, analisaremos o modo como Jesus de
Nazaré administrou aquele grupo de doze pessoas bastante
difíceis. Quando iniciei minha pesquisa, achava que
tinha apenas encontrado um ótimo tema. Aos poucos, fui
percebendo na pedagogia do Mestre dos mestres, princípios
de psicologia que servem de luz para todos os que
têm diante de si o desafio de liderar pessoas difíceis. É
claro que não fui o primeiro e nem serei o último a garimpar
neste filão de ouro. Encontrei belíssimas reflexões
sobre este tema nas Audiências de quarta-feira do papa
Bento XVI, no ano de 2006. Foram muito úteis também a
pesquisa e as descobertas do psiquiatra Augusto Cury em
seu best seller O Mestre Inesquecível.
Ao final deste livro incluímos uma coleção de frases interessantes
que encontramos ao longo de nossos estudos
sobre o tema. A sabedoria dos ditados populares pode abrir
os nossos olhos e a nossa mente com poucas palavras.
Liderar é conseguir a “coesão” de um grupo em torno
de uma “visão” que motiva a “ação” de caminhar na direção
da meta. Liderar é, portanto, a arte de gerar coesão.
Mas, ao iniciarem suas tarefas, os líderes logo percebem
que existem “forças de dispersão” que provocam os mais
diferentes tipos de dificuldades. Os conflitos já começaram
na primeira segunda-feira da história. Liderar, portanto,
exige esmerar-se na arte de administrar os conflitos.
Este é o tema deste livro.
25
Saberes fundamentais
Como administrar conflitos? Antes de verificarmos o
modo como Jesus realizou esta proeza com seus apóstolos,
gostaria de dar algumas dicas práticas que foram
surgindo ao longo de minhas leituras e entrevistas com
grandes líderes.
A ARTE DA GUERRA
O livro A Arte da Guerra3 foi escrito há mais de 2.500
anos pelo general chinês Sun Tzu. Este clássico, utilizado
até hoje pelos exércitos em todo o mundo, está longe
de ser apenas um manual que ensina táticas de guerrilha.
26 27
Seus saberes mostram como administrar a “nossa guerra
de todos os dias”. De alguma maneira, todos somos soldados
no campo de batalha. Precisamos entender “a arte
da guerra”. Somente assim será possível evitar os conflitos
antes mesmo que eles surjam. Neste sentido, não seria
nada absurdo mudar o título do livro para A Arte da Paz.
Sabemos que uma das sete virtudes do líder amoroso
é a paciência, que poderia ser definida como ciência da paz4.
Deste modo, todo líder paciente é, na verdade, um grande
guerreiro. O inverso também é verdade. Todo grande lutador
é uma pessoa extremamente paciente. Isso aparece
bem em algumas artes marciais nas quais para vencer é
necessário observar à exaustão os movimentos do adversário
e desarmá-lo antes mesmo que ataque. Pode parecer
contraditório, mas estas são lutas de paz. A violência é
reduzida ao mínimo exigido pela legítima defesa. É disto
que trata a arte da guerra: legítima defesa.
O primeiro grande segredo é observar os movimentos
do adversário. Foi assim que o pequeno Davi venceu o
gigante Golias. Não devemos economizar tempo nesta
tarefa. Faça todos os cálculos necessários. Pessoas são um
poço de complexidade. Nem sempre aquilo que aparece
na primeira impressão é a realidade mais profunda. Líderes
amorosos são comunicativos, o que significa que são
hábeis em formular perguntas, mais do que em arriscar
precipitadamente uma resposta. Uma pergunta sempre é
um caminho de paz. Se você observar bem os movimentos
do seu adversário, poderá “vencer sem mesmo ter que
lutar”. Esta é a vitória dos grandes líderes.
Um segundo exercício é o desapego emocional diante
da realidade observada. Os afetos costumam nos deixar
cegos como a quem olha para o Sol. Isso não significa ser
frio ou fugir dos relacionamentos. A luz solar é essencial,
porém expor-se demais pode levar a perigosas queimaduras.
Quando falamos em desapego emocional estamos falando
de ponderação. Por razões afetivas podemos cair em
debates inúteis ou em conflitos desnecessários. A imparcialidade
é fundamental para que a nossa reação seja eficaz
diante do perigo. Lembre-se que o seu objetivo não é
destruir o adversário, mas apenas vencer a batalha. Vencer
sem destruir é possível apenas para os líderes de verdade.
Os vingativos não entendem esta lógica. Acabam entrando
no círculo vicioso da violência. É ruim para todos! Os
amorosos entendem a lógica do perdão e promovem o círculo
virtuoso da paz. É bom para todos!
A terceira dica é a flexibilidade. Pessoas rígidas não são
bons guerreiros. A agilidade é fundamental para que o
soldado possa permanecer vivo até o final da batalha. Isto
é muito semelhante à virtude da resiliência, que descrevemos
como uma das habilidades do líder amoroso5. Ele é
flexível como uma ponte. Por isso, suporta pesos maiores
sem quebrar. Por falta de flexibilidade o Titanic afundou
28 29
ao chocar-se com um iceberg. Podemos ser grandes, mas
isso não impedirá nossa derrota se formos rígidos demais
em nossas ideias e emoções, em nossa visão e em nossos
paradigmas. Ser flexível é, por exemplo, elogiar alguém
que acabou de ser seu crítico. Não seria este o conselho
de Jesus ao dizer: “amai os vossos inimigos [...] orai por
aqueles que vos caluniam”6?!
Outra dica é exercitar a síntese entre ternura e vigor. Podemos
ver isso estampado com genialidade na figura do
apóstolo Pedro, na pintura de Leonardo da Vinci. Ele fala
com ternura aos ouvidos de João e em uma das mãos segura
uma faca, pronto para o ataque. Esta síntese somente
é possível para as pessoas benevolentes, capazes de viver a
virtude da compaixão. Os malvados acabam vítimas de sua
própria raiva, de sua própria cobiça. O perdão é a virtude
dos fortes. Significa a capacidade de não permitir que o mal
do outro habite em você. Outra síntese muito próxima desta
é entre humildade e coragem. Os covardes e orgulhosos são
vítimas de sua presunção. O apóstolo Paulo exprimiu esta
síntese quando disse “quando sou fraco, então é que sou
forte”. Unir força e fraqueza é fundamental para chegar às
grandes conquistas. Sua maior força pode estar justamente
naquilo que você julga ser sua principal fraqueza.
A Arte da Guerra ensina ainda a esmerar-se em um
aguçado senso de previsão. Após observar, somos capazes
de prever qual será o próximo movimento do inimigo.
Somente assim poderemos surpreendê-lo, imobilizá-lo e
vencer com facilidade. A batalha é vencida mais pela razão
do que pela força.
Uma das principais lições de A Arte da Guerra é que
devemos observar as pessoas em seu ambiente. Mudamos
com a mudança de contexto. Uma coisa é combater no terreno
do inimigo, outra coisa é atraí-lo para o seu terreno.
A Arte da Guerra fala também do valor dos espiões para
conhecer melhor o adversário. Esta tática pode não parecer
muito leal, porém, sozinhos nem sempre somos capazes
de conhecer as pessoas difíceis com quem convivemos.
Sempre é bom perguntar como outros estão vendo
as atitudes deste ou daquele. Pode ser que nossa visão seja
tragicamente distorcida.
Finalmente, o general Sun Tzu ensina que para exercitar
a arte da guerra é preciso ponderação. Aristóteles chamou isso
de equilíbrio e Santo Tomás incluiu esta atitude na virtude
cardeal da temperança. A raiz é a mesma. Exageros levam ao
fracasso. Não será com longos e intermináveis discursos ou
com potentes canhões que você vencerá os conflitos. A paz
é alcançada por ponderados diálogos diplomáticos. Como
disse o saudoso poeta do protesto, Geraldo Vandré, é preciso
“acreditar nas flores vencendo os canhões”.
Aliás, isto me lembra o clássico Tistu, o Menino do Dedo
Verde. Lembra? Ele tinha um dom fantástico. Onde seu
30 31
dedo tocava nasciam flores. Acha bom? O menino era
traumatizado por causa disso. Até o dia em que, no meio
de uma batalha, percebeu que tocando nos canhões saíam
flores em vez de bombas. A partir deste fato, a cidade que
fabricava canhões passou a cultivar flores e mudou até de
nome: Miraflores. A história dá pano pra manga, mas no
final descobrem: “Tistu era um anjo”.
O FIO DA MEADA
Como nos ensinou A Arte da Guerra, administrar conflitos
exige a virtude da paciência. Isto me lembra aquele
novelo de lã que minha saudosa avó Isaura pacientemente
desenleava. Tudo depende de se achar o fio da meada.
Sim! Os relacionamentos também têm um jeito certo de
serem administrados. É preciso achar o “fio”. Caso contrário,
viveremos eternamente num emaranhado de brigas e
confusão. O pior é que acabamos nos acostumando com
a bagunça nos relacionamentos. Já percebeu como nosso
mundo ultramoderno está cheio de fios por todos os
lados? Basta prestar atenção nos fios do computador. A
vida está mais ou menos assim.
Portanto, este livro não é apenas para empresários. É
para todos os que procuram encontrar o fio da meada na
arte de liderar. Há pais com filhos difíceis e também filhos
com pais complicados; qual professor não tem um aluno
difícil? Alguém, com muito bom humor, pediu-me que
depois deste livro escrevesse outro: Como Ser Liderado por
Pessoas Difíceis. É verdade, muitos patrões não são nada
fáceis de lidar. Este livro, com certeza, poderá lhe dar algumas
dicas práticas.
Falando em fio, lembro de uma técnica de pescadores
conhecida como “dar linha”. Para pescar é preciso muita
paciência. Primeiro coloque corretamente a isca no anzol.
Depois jogue a linha na água e espere... espere... espere.
Evite rumores. Quando finalmente fisgar o peixe — aí
vem a técnica —, não puxe imediatamente. O segredo é
“dar linha”. Se for precipitado, o peixe comerá a isca e não
morderá o anzol. Quando você pacientemente “dá linha”,
o peixe avança sobre a isca e acaba fisgado. Esta técnica
pode parecer cruel e antiecológica, mas no relacionamento
com as pessoas difíceis é exatamente isso que devemos
fazer. Se você for precipitado, não “pescará” aquela pessoa
para a coesão do grupo. Se quiser conquistar alguém,
“dê linha”, ou seja, deixe-o à vontade para falar, brigar,
se expressar... Escute sem rumores. Existe uma hora certa
para você “puxar o anzol”.
Que hora é esta? Pergunte ao pescador! Certamente
ele lhe dirá que existem muitas outras técnicas para uma
boa pescaria. É preciso pescar no lugar certo. Nem sempre
o “mar está pra peixe”. Pratique o “truque da ceva”,
ou seja, durante algum tempo jogue comida naquele local
32 33
e o peixe se acostumará a comer lá. Na hora H será facilmente
fisgado. Use a isca certa para o peixe certo. Pergunte-
se qual é o gosto do peixe que você pretende pescar.
Use o anzol certo. Um arpão não funciona para pescar uma
tilápia, assim como com um pequeno anzol você não pescará
um tubarão. Dizem que iscas vivas atraem mais. Peixe
também tem hora para comer. Conheça estes horários e ritos
do povo do rio... tão diferentes dos horários do povo do
mar. Mantenha a linha sempre esticada. Lições de pescador...
e pensar que a maioria do grupo escolhido por
Jesus era composta por pescadores. Um dia o Mestre disse
a eles: “De hoje em diante usem as técnicas da pescaria
para pescar pessoas”7. Deu mais que certo! Como um carpinteiro
pôde ensinar essas lições aos pescadores? Como
os pescadores aceitaram lições de pescaria vindas de um
carpinteiro do interior? É que Jesus, antes de ensinar, certamente
aprendeu com eles.
O psiquiatra Augusto Cury analisou de mil maneiras a
psicopedagogia de Jesus. Segundo ele, o Mestre dos mestres
foi um “vendedor de sonhos”. Em outras palavras,
foi alguém capaz de passar sua visão para os seus colaboradores.
Quando Ele disse: “Segui-me e eu farei de vós
pescadores de homens”, na verdade mudou radicalmente
a visão deles. Soube vender seus sonhos. Soube encantar
com uma missão e gerou coesão em torno dela. É claro que
eles não entenderam de imediato. O próprio Pedro, como
veremos, demorou um bocado para entender a vitória que
passa pela derrota da cruz. Parecia loucura. Mas a adesão
ao sonho do Mestre falou mais alto. As dificuldades são
superadas com mais facilidade quando conseguimos encantar
os colaboradores com uma nova visão.
DICAS PRÁTICAS
Qual seria a melhor estratégia para vencer os conflitos
de todos os dias? Bater de frente? Claro que não. Aqui vão
algumas dicas práticas que recolhi na conversa com líderes
que considero vencedores na arte de administrar conflitos:
ñ Perdoe: pense... O que Jesus faria no meu lugar?
ñ Conte até 10... E aproveite para respirar!
ñ Não dê a reposta apressadamente: uma pergunta
vale ouro.
ñ Mude de assunto.
ñ Procure entender o ponto de vista do outro. Pergunte:
E se eu fosse você?
ñ Saiba que cada conflito esconde uma lição. Aproveite
para aprender.
ñ Para algumas pessoas a distância é a única solução.
ñ Lembre-se da linha de trem: PARE, OLHE, ESCUTE!
ñ Está com raiva? Vá pescar (ou vá rezar)!!!
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ñ Elogie... Melhor cultivar trigo do que arrancar joio.
ñ Coração quente e cabeça fria... O contrário é tragédia
na certa.
ñ Pergunte: Poderia ser pior?
ñ Lembre-se de que “o corpo fala”.
ñ Permita que o outro coloque a raiva para fora.
ñ Saiba distinguir o que vem da pessoa e o que é fruto
da “personalidade corporativa”, ou seja, aquilo que
recebemos de nossa cultura familiar ou social. Não
podemos rejeitar uma pessoa, preconceituosamente,
apenas porque ela tem o mesmo sotaque daquele
com quem já tivemos experiências negativas.
ñ Após fazer tudo isso... Não deixe de dizer o que você
pensa!
ñ Depois procure um lugar quieto e faça uma prece.
Deus é especialista em tratar com pessoas difíceis...
A começar por cada um de nós. Ele poderá lhe dar
dicas mais precisas do que estas que acabou de ler.
A FÓRMULA DO FRACASSO
Quer montar uma péssima equipe de trabalho, um
grupo de derrotados? Escolha apenas pessoas maleáveis
e fáceis de liderar. Quer montar uma equipe de sucesso?
Escolha pessoas difíceis. Elas têm um potencial de liderança
que está aplicado no campo errado. Jesus escolheu
uma equipe de doze pessoas muito, mas muito difíceis.
Com seu jeito amoroso e amável, o Mestre modificou o
comportamento de cada um deles, dando início ao maior
empreendimento de todos os tempos: o cristianismo. Procure
seguir este exemplo e reconhecer o grande potencial
que está escondido por trás das pessoas difíceis. Meus
melhores alunos certamente não foram os mais calados
e disciplinados. Não raro tive alunos difíceis, que hoje
reconheço como grandes líderes.
Você pode transformar aquele fofoqueiro num ótimo
relações-públicas. Deixe-o falar, mas ensine a falar a palavra
certa, na hora certa, para a pessoa certa. Transforme
o ambicioso em um gerente de sucesso. Deixe-o tomar as
iniciativas, mas purifique suas motivações e seu egocentrismo.
Você pode transformar o vaidoso, o rancoroso, o
invejoso... Busque o potencial positivo deles e você terá
uma equipe de sucesso, ou seja, uma equipe de líderes.
Sobre este potencial positivo dos “difíceis”, encontrei
uma dessas simpáticas parábolas da Internet, que vale a
pena reproduzir aqui. É a “Fábula do porco-espinho”: “Conta-
se que durante a era glacial muitos animais morriam por
causa do frio. Os porcos-espinhos, percebendo a situação,
resolveram se juntar em grupos. Assim se agasalhavam e
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se protegiam mutuamente, mas os espinhos de cada um
feriam os companheiros mais próximos, justamente os que
ofereciam mais calor. Por isso, decidiram se afastar uns dos
outros e voltaram a morrer congelados. Precisavam fazer
uma escolha: ou aceitavam os espinhos dos companheiros
ou desapareceriam da Terra. Com sabedoria, decidiram
voltar a ficar juntos. Aprenderam assim a conviver com as
pequenas feridas que a relação com uma pessoa muito próxima
podia causar, já que o mais importante era o calor do
outro. E assim sobreviveram. Moral da história: o melhor
relacionamento não é aquele que une pessoas perfeitas, mas
aquele no qual cada um aprende a conviver com os defeitos
do outro e admirar suas qualidades.”
Se estiver procurando formar uma equipe de liderados,
prepare-se para a falência. Sua liderança se confirma quando
gera outros líderes. Quando todos lhe obedecerem sem
questionar, não se iluda pensando que construiu uma grande
equipe. Você atingiu o grau máximo da mediocridade.
Tenha pelo menos uma atitude honesta e peça demissão.
A REGRA DE OURO
O clássico Como Fazer Amigos & Influenciar Pessoas, de
Dale Carnegie, vendeu nos últimos cinquenta anos 50
milhões de exemplares. Li-o pela primeira vez em minha
adolescência. Na ocasião não lembro se cheguei ao final
do livro. Recentemente tive a curiosidade de reler para
descobrir qual seria o “segredo” tão fantástico que leva
milhões de pessoas a ler e comentar esta obra. Na medida
em que avançava na leitura, ia percebendo que o autor
não fez outra coisa senão pegar uma das mais famosas
frases de Jesus e aplicar às diversas situações da vida humana.
Trata-se da “regra de ouro”: “Faça aos outros o que
gostaria que os outros fizessem a você”8. Na verdade, Jesus
deu formato positivo ao velho ditado conhecido em muitas
religiões da humanidade: “Não faça aos outros o que
não gostaria que eles fizessem a você”.
No fundo, esta forma positiva do ditado é a explicitação
prática daquilo que o próprio Mestre de Nazaré chamou
de amor. Esta palavra desgastada pelo uso e pelo abuso
pode significar tudo, ou seja, nada!!! Para alguns, o amor é
apenas um sentimento vago, uma emoção, um afeto, uma
caridade, filantropia etc. O amor pregado por Jesus como
cerne da religião é uma atitude que toca cada gesto, cada
decisão, cada palavra, cada pensamento. O amor nos configura.
O discípulo amado vai resumir tudo isso em sua
carta dizendo radicalmente que “Deus é amor”. A amorosidade
é um jeito de ser no mundo. Quando Jesus disse:
“aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”9
estava querendo nos ensinar esta lição: a cordialidade!
Resumindo: amar é fazer aos outros o que gostaríamos
que eles fizessem a nós. Esta é uma regra prática que
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pode ser aplicada nas mais diversas situações, inclusive
no modo de relacionar-se com pessoas difíceis. Os líderes
amorosos sabem muito bem disso. Para tornar este assunto
mais prático e compreensível, vamos dar um exemplo.
Como seria um professor amoroso? Certamente não
é aquele que pensa que está na sala de aula apenas para
ensinar. Não está. Ele está ali principalmente para fazer
o aluno aprender; e entre ensinar e fazer aprender existe
uma distância como entre o céu e a terra. Quem apenas
ensina tem o foco no conteúdo que conhece e que está preparado
para transmitir aos seus alunos. Uma etimologia
desta palavra indica a origem na expressão latina a-lumen,
ou seja, aquele que não tem luz10. Ora, convenhamos, ninguém
é um poço de trevas, um quadro sem nada escrito.
Temos conhecimentos tácitos, experiências pré-adquiridas,
informações não sistematizadas... Ter o foco no conteúdo
é o mesmo que ter o foco principal em si mesmo.
Por mais “sabido” que seja o professor, se os seus alunos
passarem o semestre calados, aprenderão muito pouco; e
ainda este pouco será rapidamente esquecido por falta de
relevância vital.
O mestre amoroso é diferente. O foco dele está no discípulo.
Ele reconhece a luz interior que está em cada um. Ele
próprio se coloca diante do outro como um aprendiz. Ensina
melhor quem sabe fazer perguntas. O filósofo Sócrates
chamava este método de maiêutica. É a aplicação pedagógica
da regra de ouro: faça aos outros a pergunta que gostaria que os
outros fizessem a você. Chamam isso de construtivismo. Não é
preciso grande arcabouço teórico para assumir esta postura
pedagógica amorosa, construtivista, interrogante. Nossa didática
está invertida. A pergunta vem só no final, na prova!
Precisamos recuperar o primado da interrogação. Se fizéssemos
mais perguntas, boa parte dos conflitos seria evitada.
Como diz a velha canção, “haveria menos gente difícil e
mais gente com coração”11.
NÃO COMPRE PALMEIRAS ADULTAS
Andando por minha cidade natal, percebi que alguma
coisa havia mudado na fachada daquele pequeno shopping.
A recente construção estava com um ar de loja antiga, estabilizada
e tradicional. Foi quando percebi um belo conjunto
de palmeiras imperiais adultas. Havia anos que passava
pelo local e nunca tinha percebido aquelas imponentes árvores.
Alguém me informou que eles haviam comprado a
peso de ouro cada uma das palmeiras já adultas.
Pode dar certo na fachada de uma empresa recente,
mas na vida não é possível comprar a experiência e a
tradição. As empresas costumam colocar em seus rótulos:
“Desde 1877”. Quem vê esta apresentação sabe que
o produto já está mais que experimentado, aprovado,
consolidado.
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Para liderar pessoas adultas você pode ler uma pilha
de livros como este, mas o que vale mesmo é a sua experiência
pessoal. Relacionamentos são como palmeiras
pequenas que temos que cultivar todos os dias. Um dia
ficarão adultas. Nossos relacionamentos também. Um
dia nos orgulharemos daquela amizade que já dura trinta
anos e foi construída comendo muito sal juntos. Isto
fala mais do que palmeiras adultas na fachada de seu empreendimento.
A cordialidade entre os membros de uma
equipe é o melhor selo de qualidade total.
NÃO BASTA O AMOR... É PRECISO HUMOR!
Dizem que os fundamentalistas não conseguem sorrir.
São sisudos e mal-amados. Mas o “Deus” que defendem
de modo tão sério é, ao contrário, alguém que sabe brincar.
Esta afirmação pode soar estranha para os que têm
uma visão distorcida do humor. Ainda existe quem pense
que brincadeira é coisa de criança. Em minha infância,
ouvi muitos professores dizendo que “sala de aula não
é lugar de brincadeira”. Será? Há até quem sustente que
“com Deus não se brinca”.
O orientador de meu doutorado em educação na Universidade
de São Paulo (USP), Jean Lauand, fez sua defesa
de livre-docência exatamente sobre este tema: Deus
ludens — O lúdico no pensamento de Tomás de Aquino e
na pedagogia medieval. Uma das máximas que Lauand
encontrou no pensamento de Tomás é: Ludus est necessarius
ad conversationem humanae vita, traduzindo, “O
brincar é necessário para (levar uma) a vida humana”12.
É exatamente o contrário da caricatura medieval pintada
por Umberto Eco em seu best seller O nome da rosa. O riso e
a brincadeira eram parte integrante da pedagogia dos jogos
praticada na época. Neste sentido, a presunçosa modernidade
não teria ficado séria demais? Será que alguns
avanços da ciência não nos fizeram “perder a graça”?
O Deus brincalhão revelado por Tomás e redescoberto
por Lauand está estampado com todas as letras na Bíblia
em um poético texto do livro dos Provérbios: “eu estava
ao seu lado como mestre-de-obras; eu era seu encanto, dia
após dia, brincando todo o tempo, na sua presença, brincando
na superfície da terra e alegrando-me em estar com
os filhos dos homens”13.
Diante de algumas pessoas difíceis, precisamos fazer
algum esforço para não perder o bom humor. Alguns realmente
nos “tiram do sério”. É então que entra em cena a
sabedoria das frases de para-choques de caminhão: “Está
com raiva? Vá pescar!”
Mas atenção! Manter o bom humor não significa revidar
com palavras de fina ironia, sarcasmo ou cinismo. O
bom humor é generoso, gentil, respeitoso. Certamente
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você conhece pessoas que fazem “piada” com tudo e com
todos. Acabam se tornando pessoas difíceis. O bom humor
é inteligente, sereno, sutil. Basta pensar nos clássicos
de Chaplin. Nem são necessárias palavras. Um gesto cinematográfico
é suficiente para colorir a nossa face com
aquele sorriso gostoso.
Pessoas bem-humoradas mudam o ambiente onde vivem.
Infelizmente o mau humor também tem altíssimo
potencial. Viver com pessoas mal-humoradas exige algumas
habilidades fundamentais. A principal delas é ser
pato e não esponja...
O PATO E A ESPONJA
Por acaso você já observou o que acontece com os
patos quando dão seus mergulhos na lagoa? Eles simplesmente
não se molham. Suas penas são cobertas com
uma camada de óleo, tornando a ave impermeável. Logo
abaixo de sua cauda está localizada a glândula uropigial,
que produz a secreção oleosa que salva o pato de sair encharcado
de cada mergulho. Ele retira cuidadosamente
o óleo com o bico e o espalha por todo o corpo. Se você
lavar um pato com detergente, ele se afogará no primeiro
mergulho. Mas o pato não é a única ave privilegiada com
esta proteção. Praticamente metade das aves possuem a
tal glândula uropigial.
Ao liderar pessoas difíceis é fundamental desenvolver
um mecanismo de proteção parecido com o do pato. De
alguma maneira, é preciso que fiquemos impermeáveis. O
grande erro é deixar que o temperamento difícil de uma
pessoa se torne referência para você e para todos ao redor.
Se alguém fala alto demais em seu ambiente de trabalho,
não vai demorar para que todos comecem a se comunicar
aos berros. Será a vitória do erro. É preciso que aprendamos
a nos tornar um pouco surdos, mantendo um jeito
sereno de falar. Impermeáveis. O silêncio falará mais alto
que os gritos e a serenidade será a referência determinante
para aquele ambiente.
O problema é que, além de não sermos patos, às vezes
nos comportamos como verdadeiras esponjas. Temos a trágica
capacidade de absorver tudo. Se alguém vomita num
lugar público, logo buscamos um balde d’água para limpar
o lugar. Por que não fazemos o mesmo com as pessoas
que vomitam mau humor, inveja e raiva? Absorver estes
sentimentos como uma esponja é tão asqueroso e prejudicial
quanto absorver o vômito alheio.
Se pensássemos desta maneira, não ficaríamos com tanta
facilidade nos remoendo em ressentimentos. Prestou atenção
nesta palavra? Vou repetir: “re-sentimento”. Isso mesmo! É
sentir de novo o que já fez mal da primeira vez. Recebemos
uma ofensa. Basta a dor uma vez só. Mas preferimos comentar
ressentidamente com alguém, depois com outro e
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mais outro. Ao final do dia já “re-sentimos” a mesma dor
várias vezes. Jogue um balde de água nesta sujeira. O perdão
é o melhor remédio. Seja pato... não seja esponja.
QUATRO AÇÕES ESTRATÉGICAS
Para chegar a esta impermeabilidade de que acabei de
falar, existem, no mínimo, quatro ações estratégicas:
1. IDENTIFICAR: Conheça os principais “tipos difíceis”
e como funciona a sua dinâmica perversa. É neste sentido
que este livro pode ajudar você. Cada tipo difícil tem sua
própria dinâmica de funcionamento. Um rancoroso funciona
diferente de um invejoso. Há um mecanismo interno
que dá coerência a este agir complicado. Identificando
o “tipo” será mais fácil compreender o modo ideal de se
relacionar com esta pessoa, para chegar à desejada harmonia.
Reconheça também que “tipo” é você. Não imagine
ser o santo dos santos. Use o desconfiômetro para um pouco
de autocrítica. Um espelho sincero e falante como aquele
da fábula seria de muita utilidade. Somos mais hábeis
para ver os defeitos dos outros. Os líderes amorosos também
já foram pessoas difíceis, mas conseguiram enxergar
seus limites e polir suas próprias arestas. Para identificar
um “tipo” é preciso não reagir diante da agressão. Deixe
o “difícil” dar o primeiro passo. O peixe morre pela boca.
Escute com atenção sem absorver o fel. Lembre-se de que
para identificar é preciso manter uma distância estratégica.
Olhe para dentro de você mesmo e identifique qual sua
reação. Escolha o tipo de comportamento ideal.
2. COMPREENDER: Pergunte agora para si mesmo:
Qual seria a origem do comportamento difícil? Seria o
foco na tarefa? Seria o foco na norma a ser cumprida?
Seria o foco na busca de ser aceito socialmente? Seria o
foco na necessidade de ser reconhecido? Seria um vício
de comportamento? Seria um trauma pessoal? Ou seria
pura maldade? O líder amoroso é compreensivo. Isto não
significa aceitar os erros, mas apenas ser capaz de distinguir
as pessoas de seus “pecados” e compreender as
razões por que agem desta ou daquela maneira. É o exercício
que Ariano Suassuna, de maneira genial, coloca no
final do Auto da Compadecida. No julgamento de cada um
dos personagens, a Compadecida mostra-se compreensiva.
Ela consegue ver as razões por trás das ações. Para
a mulher que traiu o seu marido, ela diz: “Eu entendo
tudo isso mais do que você pensa. Sei o que as mulheres
passam no mundo, se bem que não tenha do que me
queixar, porque meu marido era o que se pode chamar
de um santo”. Mais surpreendente é a maneira como o
Filho da Compadecida, que preside o juízo final na trama
de Suassuna, compreende as razões escondidas no coração
de Severino Lampião: “Severino e o cangaceiro dele
foram meros instrumentos de sua cólera. Enlouqueceram
ambos, depois que a polícia matou a família deles, e não
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eram responsáveis por seus atos. Podem ir para ali”. E os
dois saem para o Céu!
3. INFLUENCIAR: Lembre-se da regra de ouro para influenciar
alguém: “faça ao outro o que gostaria que ele fizesse
a você”, traduzida de mil maneiras em Como Fazer Amigos
& Influenciar Pessoas, de Dale Carnegie. O livro começa com
uma frase intrigante: “Se quer tirar mel, não espante a colmeia”.
Traduzindo: se você quer influenciar as pessoas, em
um primeiro momento não critique, não condene e não se
queixe. Ao contrário, o primeiro contato deve ser permeado
por elogios sinceros. Com isso, conseguimos um elemento
fundamental para influenciar alguém: a empatia. Sem isso,
todo o relacionamento posterior poderá ser um fracasso.
É importante sorrir para as pessoas, interessar-se por suas
histórias e dar-se tempo para ouvir o que elas têm a dizer.
Chamar a pessoa pelo nome é de fundamental importância
se você quer conquistar a amizade dela. Carnegie diz que
“a melhor maneira de vencer uma discussão é evitá-la”. É
mais inteligente respeitar a opinião do outro, ainda que seja
diametralmente oposta à sua. Ao expor seus argumentos,
mostre-se simpático ao que o outro disse e cite reforçando a
ideia dele. Jamais diga “não concordo com você” ou “na
minha opinião você está errado”. Seja amigável e terá amigos.
Seja amável e influenciará as pessoas.
4. CONVERTER: Se você identificou o tipo, compreendeu
suas razões, influenciou positivamente, agora só falta
modificar o comportamento desta pessoa de modo que o
grupo coeso possa avançar em direção à meta. Na parte final
de seu livro, Dale Carnegie mostra como os líderes podem
modificar o comportamento das pessoas. Segundo ele,
o primeiro passo é não bater de frente. Melhor elogiar o que
a pessoa tem de bom e minimizar a importância daquilo
que ela tem de “difícil”. Antes de mostrar este “pequeno defeito”,
reconheça também que você tem suas dificuldades e
permita que a pessoa o ajude. Jamais corrija as pessoas publicamente.
O dano será irreparável para a equipe. Valorize
os progressos no comportamento positivo da pessoa.
O SEGREDO DO MACACO VELHO
Entre todos estes “saberes fundamentais” existe um
que está na raiz. Os líderes de sucesso são pessoas que
sabem “abrir as mãos”. Sim. Parece simplório, mas é apenas
isso. Abra as mãos, os braços, os ouvidos, a mente e o
coração e você será bem-sucedido.
Vamos explicar este “segredo” do sucesso com um
exemplo. Você sabe como se pegam macacos na África?
Amarra-se uma cumbuca em uma árvore. Nela são colocadas
algumas frutinhas. O caçador fabrica a cumbuca de
tal forma que a mão do macaco entre aberta, mas não saia
fechada. Ao pegar as frutinhas a vítima não consegue abrir
as mãos, simplesmente porque os macacos não possuem a
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faculdade mental da reversibilidade, ou seja, pensar para
trás: “Por que estou preso? Porque fechei a mão. E por que
fechei a mão? Para pegar o alimento. Opa!!! Vou abrir as
mãos e escaparei do caçador”. Tão óbvio. Basta abrir
as mãos e seremos livres, vencedores. Mas agimos exatamente
como o macaco novo. Fechamos as mãos em torno
de nossas ideias, de nossos paradigmas, pensamentos e
interesses. Acabamos prisioneiros de nós mesmos. Como
diz a canção popular brasileira: “eu, caçador de mim”!
O segredo do sucesso está em abrir as mãos. Jesus revelou
isso quando disse que quem quiser ganhar vai perder e quem
aceitar perder vai ganhar. Os chineses já sabiam disso quando
diziam que na porta da memória existe um soldado chamado
desejo. Se você insistir em querer lembrar aquele nome,
dificilmente lembrará. Mas se desistir de lembrar... cedo ou
tarde recordará. É o que o psiquiatra Viktor Frankl chamou
de intenção paradoxal. Queira o que não quer e você alcançará.
É o que Santo Inácio de Loyola chamou de indiferença. Não é
apatia. É liberdade interior. É motivação autêntica. No fundo,
todos descobriram a mesma coisa. Os líderes de sucesso
abrem a mão. E aí... vai continuar com a mão fechada?
DEIXE O REI SER REI
Uma última dica para liderar pessoas difíceis encontrei
no filme Anna e o Rei (Anna and the King), produção de 1999,
direção de Andy Tennant, com Jodie Foster no papel de
Anna Leonowens, uma viúva inglesa que, em 1862, vai
trabalhar como professora dos filhos do rei Mongkut, em
Bangkok, capital do Sião. O rei acaba se encantando com
a formosura da professora, apesar de ela ter um temperamento
forte e, às vezes, autoritário. Ambos mantêm um
relacionamento comedido que evolui para uma amizade
sincera e verdadeira.
No meio da trama, Tuptim, uma das concumbinas do
rei, apaixona-se por um plebeu. Descoberta a traição, seria
necessário aplicar a lei: pena de morte. O tribunal condena
o casal. Somente o rei poderia aplicar o indulto real.
Neste momento, Anna diz ao rei publicamente que ele deveria
inocentar a moça, e apresenta vários motivos para
isso. Praticamente Anna intima o rei a tomar esta atitude.
Resultado: o rei ordena que se cumpra a execução. O casal
é morto, conforme a determinação do tribunal.
Inconformada, Anna vai reclamar com o rei, que lhe
diz: “Eu já havia decidido livrá-los da morte. Tinha autoridade
para isso, até você me dizer o que fazer. A partir daquele
momento, se eu livrasse o casal, estaria obedecendo
a você e o reino ficaria sem rei. Anna: deixe o rei ser rei”.
Moral da história: não diga à pessoa difícil o que ela
deve fazer. Não tire a autoridade dela. Fale de modo que
ela própria decida. Deixe o rei ser rei.
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ÚLTIMA DICA: PEÇA AJUDA
Os líderes geralmente têm um grande defeito: a autossuficiência.
Acham que podem resolver tudo sozinhos.
Acham que se pedirem ajuda sempre estarão incomodando.
Não é verdade. Se você tem alguém difícil em sua
equipe, seja qual for a dificuldade dele, experimente valorizá-
lo pedindo ajuda. Você terá um aliado. Não foi assim
que Jesus fez quando encontrou aquela mulher samaritana
junto ao poço de Jacó? Ele pediu um copo d’água.
O preconceito que separava samaritanos e judeus foi superado
pelo pedido de ajuda. E a mulher se tornou uma
aliada de Jesus.
Esta é uma das pinturas mais conhecidas do mundo. A
Última Ceia foi pintada por Leonardo da Vinci nos anos
1494-1498, na parede do refeitório dos dominicanos da
igreja Santa Maria delle Grazie, em Milão, na Itália, e mede
4,6 × 8,8 metros. Um minucioso trabalho de restauração
começou em 1979 e foi concluído em 1999. O lugar encontra-
se aberto para visitas e é conhecido como “Cenacolo
Vinciano”. Mas é possível ver cada detalhe desta extraordinária
pintura por meio da Internet. Em colaboração com
o Ministério para os Bens e Atividades Culturais do governo
italiano, esta e outras pinturas famosas foram fotografadas
em alta definição. O resultado pode ser visto no site:
http://www.haltadefinizione.com
Uma leitura de Leonardo da Vinci
A última ceia
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